O ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu nesta terça-feira (3) a decisão da CPMI do 8 de janeiro no Congresso que quebrou os sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático de Silvinei Vasques, ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Conforme o ministro, o embasamento usado pelos congressistas para amparar a decisão é genérico e amplo, não especificou condutas a serem apuradas e não há “situação concreta” que relacione Silvinei com suspeitas de algum ato ilícito cometido por ele nos atos de 8 de janeiro, objeto da comissão.
Captura de tela do celular de Silvinei que chegou às mãos da CPMI mostram, por exemplo, que ele tentou organizar o encontro entre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e Maurício Junot de Maria, representante da Combat Armor no Brasil, empresa investigada por fraudar licitações na venda de blindados para a PRF.
O advogado de Silvinei, Eduardo Pedro Nostrani Simão, disse que, com a decisão de Nunes, os dados já remetidos à CPMI não poderão ser usados no relatório final do colegiado.
Ele também afirmou que já esperava uma decisão positiva da Corte, “tanto pelo fato de a defesa confiar em todos os ministros do STF, quanto pelo fato de que se tratou de uma selvageria a quebra dos dados sigilosos de Silvinei Vasques, que nada tem a ver com o dia 8 de janeiro”.
“Hoje o STF deu uma resposta para os que trocaram a política pela politicagem. Ganha o STF que demonstra ser um órgão digno de confiança; ganha o Silvinei que está sendo injustiçado; ganha o Brasil e, principalmente, ganha o Estado de Direito”, declarou.
O advogado também afirmou que, apesar de os sigilos dos dados de Silvinei já terem sido levantados, há um “cunho moral” na decisão do ministro, “que é mais importante, porque ele [Silvinei] não fez nada de errado. Mais importante do que vazar [informações]”.
Decisão
No pedido ao ministro, a defesa de Silvinei argumentou que havia risco de “conhecimento público de dados pessoais seus” com a quebra dos sigilos. Os advogados também disseram que já há inquérito policial sigiloso que apura acontecimentos relacionados à decisão da quebra de sigilo pela CPMI, como os bloqueios de rodovias por caminhoneiros, em 2022.
Na decisão, Nunes Marques disse que a quebra de sigilo das comunicações “deve ser medida excepcionalíssima e recair sobre o mínimo possível para o desenvolvimento da apuração, judicial ou legislativa”.
O magistrado também afirmou que as comissões parlamentares de inquérito têm competência para afastar os sigilos de dados bancários, fiscais e de comunicações, mas que a jurisprudência do STF aponta ser possível o “controle judicial das deliberações que implicam a quebra, notadamente a fim de avaliar a existência de fundamentação adequada para a medida excepcional”.
“Como se vê, não há prévia definição do escopo específico para a quebra do sigilo, medida que se afigura ampla e genérica, a alcançar todo o conteúdo das informações bancárias, fiscais, telefônicas e telemáticas privadas do ora impetrante [Silvinei]”, disse Nunes.
“A tese segundo a qual a quebra dos sigilos do autor é necessária para a CPMI “desvelar eventuais informações imprescindíveis para a responsabilização geral dos atos” de 8 de janeiro, por ser embasada em premissa genérica e abstrata, não pode ser acatada”, afirmou.
Relatora se posiciona contra decisão
Durante a sessão desta terça-feira da CPMI, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da comissão, posicionou-se contra a decisão de Nunes Marques.
“Uma decisão dessa magnitude tem que se cumprir, mas eu preciso deixar aqui meu lamento. Para além de recorrer, a advocacia do senado fará isso, precisamos sentar e procurar remédios constitucionais para que essa medida não seja repetida. Além de pedir que nunes marques remeta a turma para a decisão plena.”
“É inadmissível que uma CPI depois de cinco meses de trabalho não possa utilizar, juntar todo o volume de informação recebido”, completou Eliziane.
Em nota, a assessoria da senadora também lamentou a medida. Leia a íntegra abaixo:
“A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Nunes Marques, ao conceder mandado de segurança em favor do ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques, preso em operação da Polícia Federal e alvo desta comissão parlamentar de inquérito é algo sobre a qual este colegiado precisa imediatamente reagir. Primeiramente, acionando a Advocacia desta Casa para recorrer.
Em segundo lugar, avaliar quais os mecanismos nós o Congresso Nacional dispomos para acionar aquela Corte de forma a fazer valer o que prevê o ordenamento jurídico: que o referido ministro autor de tal decisão monocrática que a submeta sem postergações ao colegiado próprio para sua apreciação.
Ao determinar a suspensão dos efeitos de uma deliberação tomada por essa CPMI, legitimamente constituída, mediante a qual determinou-se a quebra dos sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático de Silvinei, há mais uma vez uma intromissão indevida de um Poder da República sobre o outro. É, na nossa compreensão, interferência que não é salutar para o bom andamento dos trabalhos.
O resultado desse mandado de segurança põe por terra trabalho de meses e meses de investigação porque sequer poderemos usar uma vírgula, um número sequer, de tais dados oficiais, inclusive no relatório final.
Cumpre-se a decisão do ministro Nunes Marques, lamenta-se profundamente, mas não só isso: buscaremos remédios constitucionais e eficazes contra essa intromissão que avilta os trabalhos do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, aqui representados por este nobre Colegiado.”
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