Um grupo de dissidentes do PDT prepara um manifesto contra a candidatura do ex-ministro Ciro Gomes (PDT) e a favor da postulação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder das pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República. A articulação é mais um movimento de pressão contra o pedetista e ocorre em meio à campanha petista em busca do voto útil, a fim de liquidar o pleito presidencial ainda no primeiro turno. Na minuta do texto, os signatários exaltam a trajetória de Ciro, mas afirma que o presidenciável “que conseguia se manter em uma sintonia fina com o campo progressista já não existe mais”. Um dos idealizadores do movimento é Gabriel Cassiano, ex-aliado de Ciro que deixou a sigla e se filiou ao PSB, que indicou Geraldo Alckmin para o posto de vice-presidente na chapa do PT. André Luan, ex-diretor da Fundação Leonel Brizola em Minas Gerais, e Vinicius Dino, ex-secretário-geral da Juventude Socialista de São Paulo, também integram o movimento.
“Mais do que indignação, ver o projeto nacional de desenvolvimento errar na sua composição tática e estratégica é motivo de muita tristeza e decepção”, diz outro trecho da carta. “Diante disso, nós que apoiamos Ciro entre 2016 e 2019 clamamos a aqueles que possuem a mesma visão a não vacilarem, apoiando a única candidatura capaz de derrotar o bolsonarismo já no primeiro turno. Não se trata de voto útil. É uma necessidade histórica, algo que, mais uma vez, lamentamos ver Ciro Gomes, uma figura ímpar para pensar o desenho institucional do país, ser incapaz de enxergar essa quadra da história. Diante disso, convocamos militantes trabalhistas e dissidentes a apoiarem o ex-presidente Lula no primeiro turno. Saudações fraternas e Brizolistas”, escrevem no trecho final do manifesto.
O manifesto será lido na quarta-feira, 21, às 19 horas, em um ato no Sindicato dos Engenheiros do Rio de Janeiro, que reunirá brizolistas históricos. O evento servirá para que quadros históricos defendam o que chamam de “voto consciente” em Lula ainda no primeiro turno. Interlocutores do presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, que foi ministro do governo Lula, reconhecem o simbolismo da reunião, mas minimizam o movimento e afirmam que os articuladores do ato “não têm voto”. Nesta quinta-feira, 15, Ciro Gomes foi questionado, em coletiva de imprensa, sobre o manifesto. “Quando sair, se sair, pergunte ao presidente nacional do partido e [ao presidente] da comissão de ética. Eu não tenho nada a ver com isso”, disse. Na mais recente pesquisa Datafolha, divulgada na noite da quinta, o pedetista tinha 8% das intenções de voto. O ex-presidente Lula lidera com 45%. De acordo com o instituto, o candidato do PT tem 48% dos votos válidos. Para vencer a eleição ainda no primeiro turno, o petista precisa de 50% dos votos válidos mais um.
Leia abaixo a íntegra do manifesto:
Em 2016 um político tradicional cearense começou a ganhar a atenção de jovens entre 20 e 30 anos no país. Seja na imprensa ou nas universidades, denunciou com perspicácia e altivez o golpe em curso contra a presidenta Dilma Rousseff. Denunciou o conspirador Michel Temer, abrindo um caminho importante para alavancar um campo político próprio, uma corrente de pensamento que perseguiria um projeto nacional de desenvolvimento. Trata-se de um campo que iria repensar o nacional-desenvolvimentismo nos seus moldes clássicos, propondo ações que concebam o estado como indutor do desenvolvimento e uma importante ferramenta estratégica para a consolidação da soberania nacional.
Ao mesmo tempo, esse político tradicional de alta perspicácia intelectual conseguia atualizar o desenvolvimentismo para as condições do século XXI. Por político tradicional entendemos aquele dirigente que há anos faz parte e possui peso no debate nacional. Foi governador, Ministro de Estado duas vezes. Para muitos de nós, seu discurso programático foi uma grande surpresa no cenário político nacional. Afinal, como não havíamos escutado Ciro Gomes antes?
Vindo do Brasil Profundo, do sertão do Ceará, Ciro reconhecia o legado dos governos democrático-populares de Lula e Dilma. O responsável pela transposição do Rio São Francisco reconhecia não somente essa obra que estava paralisada desde o período imperial, como também reconhecia que durante os governos petistas o poder de compra do trabalhador brasileiro ampliou significativamente, com um salário tão forte como durante o governo de João Goulart. Ciro propunha entre 2016 e 2018 um sentido bem desenhado de desenvolvimento. A proposta era avançar ainda mais o legado desenvolvimentista gerado durante os governos petistas. Era uma crítica diplomática, de um aliado que fazia parte do mesmo campo. Saudável e equilibrada, sua posição chegava a animar até mesmo alguns militantes petistas.
Durante o ano de 2018, Ciro denunciou a obsessão persecutória de Sergio Moro contra Lula. Chegou até mesmo a defender atitudes heroicas, como levar o ex-presidente a uma embaixada para solicitar asilo político. Entretanto, por conta das divergências dentro do próprio campo da esquerda, não foi possível garantir a aliança eleitoral de Ciro e Lula. A partir de então, Ciro começa a adotar um tom mais iracundo contra a base petista. Não vamos gerar um desgaste ainda maior com a postura de Ciro, expondo por vezes seu vocabulário chulo nos vídeos e redes sociais. Não é essa nossa intenção. Porém, cabe lembrar que quem assume o tom “polarizador” no pior sentido do termo é pedetista, que agora adota uma postura de ex companheiro de trincheira.
O ano é 2022. Aquele Ciro que conseguia se manter numa sintonia fina com o campo progressista já não existe mais. Se em 2018 a grande maioria da militância trabalhista foi às ruas pedir votos para Fernando Haddad, atualmente vemos infelizmente alguns colegas dizerem que irão votar nulo em um eventual segundo turno. Há outros que pensam em apoiar até mesmo Bolsonaro. Mais do que indignação, ver o projeto nacional de desenvolvimento errar na sua composição tática e estratégica é motivo de muita tristeza e decepção.
Diante disso, nós que apoiamos Ciro entre 2016 e 2019 clamamos a aqueles que possuem a mesma visão a não vacilarem, apoiando a única candidatura capaz de derrotar o bolsonarismo já no primeiro turno. Não se trata de voto útil. É uma necessidade histórica, algo que, mais uma vez, lamentamos ver Ciro Gomes, uma figura ímpar para pensar o desenho institucional do país ser incapaz de enxergar essa quadra da história. Diante disso, convocamos militantes trabalhistas e dissidentes a apoiarem o ex-presidente Lula no primeiro turno.
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