Petrobras nomeia gerente demitido por corrupção para driblar compliance

Luiz Fernando Nery havia sido indicado em abril para comandar a Gerência de Comunicação da estatal, mas teve a nomeação barrada pelo Comitê de Conformidade
Por: Brado Jornal 01.nov.2023 às 15h24
Petrobras nomeia gerente demitido por corrupção para driblar compliance

A Petrobras nomeou Luís Fernando Nery como gerente executivo de Comunicação interino. Ele havia ocupado o mesmo cargo de 2015 a 2016, sendo o responsável por administrar o milionário orçamento de publicidade da estatal, mas foi demitido em 2019 por suspeita de corrupção. Na época, um processo administrativo interno apontou desvios em verbas para propaganda e eventos.

A nomeação foi feita em 1º de outubro, segundo informações publicadas pelo jornal O Globo. Com o título de interino, a gestão Petrobras consegue driblar as regras de compliance da empresa, aprimoradas depois do escândalo do Petrolão, que exigiriam que ele fosse avaliado pelo Comitê de Conformidade.

Nery foi indicado em abril pelo presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, para comandar a Gerência Executiva de Comunicação como titular. Na ocasião, porém, o Comitê de Conformidade da estatal barrou a volta do executivo por causa das irregularidades no passado.

Luiz Fernando Nery é ligado a Wilson Santarosa, que comandou a Gerência de Comunicação da Petrobras de 2003 a 2015, ou seja, durante os 2 mandatos iniciais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o primeiro de Dilma Rousseff (PT). É um nome de confiança do PT e possui boa relação com a FUP (Federação Única dos Petroleiros).

O executivo também é próximo de Prates. Depois da negativa do Comitê de Conformidade, o presidente da estatal o alocou como seu assessor especial na presidência. Foi o primeiro drible ao compliance da própria empresa, visto que, para o cargo, também não era necessária avaliação do comitê.

No lugar dele, foi nomeada para o comando da Gerência Executiva de Comunicação Vânia Gonçalves, como titular. Já Nery, como interino, será uma espécie de gerente substituto. Ou seja, cobrirá eventuais ausências da titular e pode ficar exercendo a função por até 180 dias. Na prática, porém, tende a ter bem mais poder e influência do que isso.


A DEMISSÃO

Luís Fernando Nery era um dos nomes fortes da Petrobras no governo Dilma. Em 2016, a estatal abriu um processo contra ele no seu órgão responsável por investigações internas, chamado CIA (Comissão Interna de Apuração).

O processo apurava possíveis irregularidades com o gasto de mais de R$ 1 milhão com ingressos em camarotes no carnaval da Bahia para políticos aliados de Dilma, além de patrocinar o trio elétrico de um parente do chefe de gabinete do ex-presidente da companhia, Sérgio Gabrielli.

Em 2019, Nery fez um acordo com a Petrobras antes do fim das investigações, sendo demitido por um consenso entre as partes. O processo só veio a ser concluído em 2020, apontando que ele foi responsável pelas irregularidades. Na época, a CIA determinou que ele fosse demitido por justa causa, mas como ele já tinha saído antes pelo acordo, escapou da punição.

No passado, Luís Fernando Nery também já esteve envolvido em outro escândalo, também relacionado a carnaval. Em 2012, ele já fazia parte da gerência, não na chefia, mas era responsável pelos patrocínios a escolas de samba do Rio de Janeiro. Naquele ano, sua mulher, Patrícia Nery, foi nomeada rainha de bateria da Portela, uma das escolas agraciadas, mesmo não sendo conhecida da comunidade.


EMPRESA QUER AFROUXAR REGRAS DE INDICAÇÕES

Paralelo a esse movimento, está em curso uma mudança no estatuto social da Petrobras que tem como principal objetivo facilitar as nomeações de políticos e membros da administração pública para cargos do alto escalão da estatal. A proposta já foi aprovada pelo Conselho de Administração e será analisada pelos acionistas em assembleia marcada para o dia 31 de novembro.

A proposta é acabar com as proibições para a indicação de administradores previstas na Lei das Estatais (Lei 13.303 de 2016), que foram consideradas inconstitucionais em decisão monocrática do ministro aposentado do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski.

Na decisão cautelar, Lewandowski disse ser inconstitucional o trecho da lei que proibia indicações “de Ministro de Estado, de Secretário de Estado, de Secretário Municipal, de titular de cargo, sem vínculo permanente com o serviço público, de natureza especial ou de direção e assessoramento superior na administração pública”.

Essa decisão ainda precisa ser confirmada no plenário do Supremo. No entanto, a Petrobras e o governo já querem formalizar o entendimento no estatuto para evitar novos questionamentos.

Na prática, a medida derrubaria impedimentos existentes atualmente para indicações de administradores para o alto escalão da companhia oriundos da administração pública.

Também foi proposta a criação de uma reserva de remuneração de capital, mas a Petrobras não deu detalhes sobre o assunto até esta segunda-feira (30). Por outro lado, a empresa indicou que segue vigente a atual política de remuneração aos acionistas.

As duas mudanças causaram reações no mercado, que teme que as mudanças nos requisitos para nomeações podem resultar em maiores questionamentos a respeito da governança, mais distante da transparência de processos.

Em 23 de outubro, quando a Petrobras fez o anúncio da proposta, a empresa perdeu R$ 32 bilhões em valor de mercado. As ações da estatal caíram mais de 6% na B3 (Bolsa de Valores de São Paulo).



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